quinta-feira, 15 de outubro de 2009

P129: MAIS UM CONTRIBUTO DO PINTO DE ALMEIDA


O Coleccionador

Aconteceu no Complexo Habitacional do Dulombi. No polo designado por Abrigo 3, parte do condomínio fechado de que faziam parte mais seis ou sete polos, o pormnenor mais importante desta urbanização era relacionado com a segurança. De facto, este complexo era guardado por duas "empresas de segurança". Uma do lado de dentro, a nossa, outra do lado de fora a "PAIGC", de tal forma que não conseguiamos sair de casa sem trazermos a arma na mão. Mas como acontece sempre nestas situações havia contactos secretos dos dois lados da barricada. Havia no Abrigo 3 o Russo que coleccionava tiros de morteiro que acertavam sempre na mouche; invariavelmente, a seguir às flagelações ele jurava que a granada tinha caido num local previamente, por ele, identificado. Para mim ele era o contacto dos turras e envia-lhes mensagens via morteiro 82. Mas além de coleccionar de tiros certeiros o Russo tinha uma colecção muito mais preciosa: relógios. Não sei por que motivo mas todos os relógios quando chegavam à Guiné paravam. Julgo não andar longe da verdade se disser que no Abrigo 3 apenas o Lancia do Manuel da Silva Azevedo nunca parou, facto que fazia espevitar a vaidade do Azevedo que repetia quase diariamente o spot publicitário da época: "Se o seu relógio não é um Lancia, lance-o fora e compre um Lancia".
Quanto aos que avariavam o Russo comprava-os todos a 50 paus cada um. Gostava que ele explicasse o que fez a todos os relógios que adquiriu. Bem, quanto aos 50 paus recebidos por cada um de nós sempre davam para pagar à lavadeira por lavar a roupa um mês inteiro.

António Fernando Pinto de Almeida