HISTÓRIAS MECÂNICAS
Porque tem correspondência com as histórias que vou contar, como preâmbulo, transcrevo o louvor registado na minha caderneta militar:
“Louvado em 11 de Fevereiro de 1972 pelo Exmo Comt. do B. Caç. 2912, pelas excepcionais qualidades demonstradas ao longo de quase 21 meses de comissão. Logo de início não tendo o mínimo de instalações necessárias para o bom desempenho das funções inerentes à sua especialidade, mostrou o Furriel Lemos ser um elemento de real valia, idealizando uma Oficina Auto e Arrecadação, a cuja construção, com a colaboração do pessoal sob o seu comando, a quem desde do princípio soube transmitir e incutir o seu entusiasmo para com o serviço, se dedicou com interesse e zelo digno de serem assinalados. Depois da construção da sua Oficina Auto, onde os seus homens já tinham condições mais propícias para trabalhar e da sua arrecadação onde instalou os seus arquivos e dispôs as várias ferramentas de mecânico auto de modo a serem facilmente localizadas e controladas, soube formar com os mecânicos e condutores Auto-Rodas subordinados, uma excelente equipa de trabalho, que constante e infatigavelmente tem dirigido e orientado ao longo de toda a comissão. De realçar ainda um cuidado e atenção dedicados às requisições das várias peças e lubrificantes necessários à reparação e manutenção das viaturas inoperacionais, conseguindo assim uma eficiência verdadeiramente extraordinária no desempenho da sua missão de tal maneira, que tem sido de orgulho para este comando o número de viaturas de que sempre tem disposto, quer para colunas de reabastecimento quer ainda para colunas de carácter operacional. Além das qualidades mencionadas é ainda de salientar o elevado sentido de disciplina, aprumo e correcção demonstrados pelo Furriel Miliciano Lemos, quer para com os seus superiores quer para com os seus subordinados. Pelos factos apontados é de inteira justiça tornar público o presente louvor”.
Como tal, era apanágio do grupo da mecânica, ter sempre as viaturas prontas para servir da melhor forma a Companhia, logo, todos beneficiavam com o zelo demonstrado pelos mecânicos-auto e condutores das viaturas, que tinham sempre o cuidado de velar pela sua manutenção.
Ainda me lembro do Rosas, do Victor, da oficina improvisada que se construiu com troncos de palmeiras (estrutura), com os oleados dos Unimogs a servir de parede e chapas de zinco, como cobertura. Também se arranjou cimento e areia para cimentar o chão e, em anexo, foi feita uma arrecadação de madeira com secretária e tudo, a fim de servir de armazém para as peças sobressalentes e secretaria auto. Tudo orientado para, em caso de necessidade, termos as peças de substituição para as avarias mais comuns. Quantas vezes fui a Bissau, de Dakota, a fim de tratar de assuntos relativos à conservação, manutenção e substituição das viaturas.
Enfim…
Certo dia, a nossa Companhia fez, como habitualmente uma coluna para abastecimento de géneros alimentícios, combustível, entre outras necessidades, passando por Bambadinca até ao Xime. Só que levámos, desta vez umas 17 viaturas. Ao passar pela sede do Batalhão, eis que o Comandante, estava na entrada, ficando estupefacto por ver tamanha mobilização de carros operacionais, comentando que a nossa coluna parecia um desfile militar em Lisboa!!! (Já que era habitual as outras companhias terem dificuldades em arranjar viaturas operacionais, pois muitas se encontravam avariadas, segundo os rumores que circulavam, e mais não adianto). Vai daí, falou com o nosso Capitão, dizendo que iria a Dulombi tratar da cedência de Unimogs para as outras Companhias. Mas eu sabia que a quantidade de carros era mais ou menos igual para cada uma, a diferença estava na operacionalidade das ditas.
Mais tarde, o Capitão dialogou comigo sobre a pretensão do Comandante, e eu retorqui que as viaturas estavam todas operacionais devido à competência dos mecânicos da nossa Companhia, assim como ao zelo dos respectivos condutores, tudo em prol do nosso bem estar e não em benefício das outras Companhias do Batalhão.
Passados uns dias, chega o Comandante a Dulombi, de helicóptero, a fim de tratar da cedência de alguns Unimogs. Como eu já sabia antecipadamente da chegada do Comandante, os carros estavam todos com graves avarias!...
Coloquei os quatro mecânicos (um era nativo e já não me recordo do nome nem como foi lá parar), e os condutores a reparar, na devida hora, as viaturas. Capôts abertos, rodas tiradas, macacos a funcionar, baterias sem carga, dínamos desmontados, etc. etc, tudo avariou ao mesmo tempo… Um desastre…
Claro que o Comandante ficou furioso, não havia viaturas, só umas quatro é que funcionavam, mas nada havia a fazer, eu tinha autonomia suficiente como responsável máximo da mecânica para tratar dos problemas – o nosso Capitão não interferiu, pelo contrário. O “Chefe Maior” nada pôde fazer com os meus argumentos bem estudados, de todas as avarias, até porque muitas das viaturas necessitavam de peças vindas de Bissau!!!
O Comandante regressou, sem antes ordenar que na próxima vez, eu tinha que ter fichas de reparação nas viaturas, descriminando a avaria, o tempo previsto de arranjo, etc, etc.
Nunca mais apareceu.
E assim, os nossos carros continuaram a servir a Companhia. Quando não havia trabalho, os mecânicos descansavam. Era o meu lema.
Por outra vez, estava eu a experimentar o jeep do Capitão e por tal motivo fui chamado à atenção, penso eu que indevidamente. Os meus mecânicos também não gostaram. Vai daí, o Rosas propôs que o jeep iria avariar! E avariou mesmo durante 15 dias!!! Coincidências.
A nossa Oficina era o restaurante da Zona! Quantos almoços, jantares, festanças, lá não se fizeram.
Os assados eram espectaculares. Também tinha sob o meu comando elementos bem intencionados… Certo dia, não havia cabrito ou cabra para a festa. Não é que, com uns pedaços de pão ao longo do caminho e em direcção ao abrigo, a pobre cabra lá entrou para seguir directamente para o forno! Mas os Futa-Fulas souberam ou desconfiaram e o assunto chegou ao Capitão. Não sei como foi resolvido, se se confirmou a situação ou não. Só sei que a cabra estava uma delícia…
Muito petróleo se gastava… principalmente de noite. “Será ou não será que seria” comercializado por alguns, em troca de ovos, carne, “favores”, etc.?
E os Unimogs gastavam 45 litros de gasolina aos 100 Km! Por mais contas que fizesse, os gastos eram sempre esses!!! Por comparação, os F16 portugueses – agora caíu um – gastam 170 litros de combustível por cada 100 Km!!!
Como já vai longa esta missiva, fico por aqui. Vou apontando outras lembranças.
quinta-feira, 31 de janeiro de 2008
domingo, 27 de janeiro de 2008
sábado, 19 de janeiro de 2008
terça-feira, 15 de janeiro de 2008
P52: MEMÓRIAS
terça-feira, 1 de janeiro de 2008
P51: SELECÇÃO NACIONAL DO DULOMBI
quarta-feira, 26 de dezembro de 2007
sexta-feira, 21 de dezembro de 2007
P49: OBRIGADO LEANDRO

Quando me propus construir o nosso Blog era minha expectativa que o mesmo fosse um fórum em que houvesse uma participação evidente por parte dos elementos que constituiram a 2700, quer com fotos, documentos ou episódios narráveis. Puro engano.
Será que a participação do Timóteo com o envio de algumas fotos e agora com a foto enviada pelo Leandro é um presságio que, finalmente, as participações começarão a brotar? Esperemos que sim.
segunda-feira, 17 de dezembro de 2007
terça-feira, 11 de dezembro de 2007
P47: VISÃO MONIZIANA DA EXPO ESTANQUEIRO
Caros Amigos
Já fui ver a exposição “Memoria Guerra Colonial” do amigo Estanqueiro.
Dou-lhe os meus parabéns pela iniciativa e pelo relevo que conseguiu dar ao seu trabalho e à C Cac 2700
De realçar o catalogo de muita boa qualidade, bem estruturado e muito bem organizado.
De referir que a relação de evacuados e recuperados. Inserida a pag. 65 do catálogo peca por omissão: em Abril 1971 houve evacuados do tornado (pelo menos 2 – penso que foram mais - que não estão relacionados) e em Julho de 1971 há um recuperado que de acordo com a relação nunca chegou a ser evacuado ???. Mas isto são fait-divers que em nada tiram o mérito do trabalho exposto.
Um abraço
Carlos Moniz
Uma nota: quanto é que o Estanqueiro pagou ao fotógrafo para aparecer em 50 % das fotografias da exposição!!!
Já fui ver a exposição “Memoria Guerra Colonial” do amigo Estanqueiro.
Dou-lhe os meus parabéns pela iniciativa e pelo relevo que conseguiu dar ao seu trabalho e à C Cac 2700
De realçar o catalogo de muita boa qualidade, bem estruturado e muito bem organizado.
De referir que a relação de evacuados e recuperados. Inserida a pag. 65 do catálogo peca por omissão: em Abril 1971 houve evacuados do tornado (pelo menos 2 – penso que foram mais - que não estão relacionados) e em Julho de 1971 há um recuperado que de acordo com a relação nunca chegou a ser evacuado ???. Mas isto são fait-divers que em nada tiram o mérito do trabalho exposto.
Um abraço
Carlos Moniz
Uma nota: quanto é que o Estanqueiro pagou ao fotógrafo para aparecer em 50 % das fotografias da exposição!!!
domingo, 9 de dezembro de 2007
P46: UMA VISÃO SOBRE A EXPOSIÇÃO DO ESTANQUEIRO
Caro Fernando,
Acabo de regressar da Exposição Fotográfica da CCaç 2700, uma bela obra que retrata o que a Vossa Cª passou por aquela terras de Dulombi.
Muita gente, muitos ilustres, outros nem tanto. O "major" Tomé, o Fernando Rosas (o historiador), o Dias da Cunha do SCP, e muitos desconhecidos para mim. E o Américo Estanqueiro, um tipo com ar modesto, que dava a entender que "era demasiado pequeno" para tanta gente ilustre, mas, aos meus olhos, muito grande para a obra que publicou.
Estavam alguns do nosso blogue. O Helder Jesus, o especialista cripto que o Spínola tinha no QG, nos inícios dos anos 70, o Teco e o Guedes da Cª 726, de Guilege. E outras figuras públicas, o Alfredo Caldeira e a Diana Andringa (penso que mulher dele). E muitas senhoras e jovens também.
Duas horas bem passadas, que ainda deram para recordar histórias daqueles tempos.
O Luís Graça, que lá conseguiu arranjar tempo para lá ir com a simpática mulher, tirou uns instantâneos à pressão, e ainda hoje, conhecendo-lhe eu a dinâmica, vai tratar de meter no blogue. E pelo interesse e comentários que fui ouvindo, também lá estava gente da CCaç 2700. Agora, vendo bem, tenho pena que não tenhas estado presente, pois era mais uma forma de nos darmos todos a conhecer.
Está o Estanqueiro de parabéns e estais vós todos da CCaç 2700, pela magnífica obra que trazem a público.
Um abraço, Fernando.
vb
Acabo de regressar da Exposição Fotográfica da CCaç 2700, uma bela obra que retrata o que a Vossa Cª passou por aquela terras de Dulombi.
Muita gente, muitos ilustres, outros nem tanto. O "major" Tomé, o Fernando Rosas (o historiador), o Dias da Cunha do SCP, e muitos desconhecidos para mim. E o Américo Estanqueiro, um tipo com ar modesto, que dava a entender que "era demasiado pequeno" para tanta gente ilustre, mas, aos meus olhos, muito grande para a obra que publicou.
Estavam alguns do nosso blogue. O Helder Jesus, o especialista cripto que o Spínola tinha no QG, nos inícios dos anos 70, o Teco e o Guedes da Cª 726, de Guilege. E outras figuras públicas, o Alfredo Caldeira e a Diana Andringa (penso que mulher dele). E muitas senhoras e jovens também.
Duas horas bem passadas, que ainda deram para recordar histórias daqueles tempos.
O Luís Graça, que lá conseguiu arranjar tempo para lá ir com a simpática mulher, tirou uns instantâneos à pressão, e ainda hoje, conhecendo-lhe eu a dinâmica, vai tratar de meter no blogue. E pelo interesse e comentários que fui ouvindo, também lá estava gente da CCaç 2700. Agora, vendo bem, tenho pena que não tenhas estado presente, pois era mais uma forma de nos darmos todos a conhecer.
Está o Estanqueiro de parabéns e estais vós todos da CCaç 2700, pela magnífica obra que trazem a público.
Um abraço, Fernando.
vb
quinta-feira, 29 de novembro de 2007
domingo, 18 de novembro de 2007
P44: CATÁLOGO DA EXPOSIÇÃO DO ESTANQUEIRO

Aproveito para informar que, infelizmente, a Fundação Mário Soares se encontra encerrada ao Sábado e Domingo, pelo que a Exposição do Estanqueiro só poderá ser visitada durante os dias úteis. Faremos todos os esforços, junto do Estanqueiro, para que a sua Exposição esteja patente durante o próximo Almoço/Confraternização da Companhia. Vai ser fácil, não temos dúvida.
terça-feira, 13 de novembro de 2007
P43: EXPOSIÇÃO DO ESTANQUEIRO

Mais que não seja, só pelo privilégio de se ver o Estanqueiro de gravata, merece um click sobre:
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com
Após acederes à pagina procura o POST 2260 de 12 de Novembro
Legenda: Elemento do Batalhão, Ravasco, Coronel Carlos Gomes, Alves e Brunheta
Foto Luís Graça (2007) Direitos reservados
quarta-feira, 7 de novembro de 2007
P42: BORA LÁ, MALTA!!!

É inaugurada no próximo dia 12 de Novembro, pelas 18h30, na Fundação Mário Soares (www.fmsoares.pt), à Rua de S. Bento, nº 160, uma exposição fotográfica versando a Guerra Colonial, onde estarão patentes algumas fotos obtidas pelo Américo Estanqueiro, tendo, fundamentalmente como é óbvio, uma incidência sobre o "nosso" Dulombi.
Daqui deixamos o apelo a todos aqueles que tenham oportunidade de se lá deslocar que não o deixem de fazer. É também um pouco de cada um de nós que a objectiva do Estanqueiro quis abraçar.
A Exposição estará patente ao público até ao dia 31 de Dezembro.
MEMÓRIA DA GUERRA COLONIAL: C. CAÇ. 2700
12 de Novembro de 2007 18,30
Exposição de fotografias de Américo Estanqueiro
Local: Sala de Exposições da Fundação Mário Soares
domingo, 4 de novembro de 2007
P41: OBRIGADO RAPAZES DA C. CAÇ. 2405

Obviamente, não foi nenhuma Herdade da Ameira* que eles nos legaram mas ao passar pelo excelente Blog do Luís Graça (até já o PRAVDA lhe faz referência - http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/)foi lá que tomei conhecimento, através da pena cibernética do Rui Felício, da estória já aqui relatada com o título: "Correia Foste Aldrabado" e que tem como fundo uma foto cedida pelo Paulo Raposo, onde se pode assistir ao início da construção da malha defensiva do Dulombi. Perante semelhante imagem senti, hoje, a necessidade de, a este tempo de distância, agradecer a todos os cabouqueiros da C. Caç. 2405 que construiram aqueles abrigos, os quais apesar da sua frieza nos deram uma sensação de segurança indescritível. Repito, não eram nenhuma Herdade da Ameira, mas houve alturas que o pareceram. Obrigado, rapazes da C. Caç. 2405. Os "atónitos periquitos" estão-vos reconhecidos, embora o Belmiro tenha utilizado na construção do NorteShopping, menos sacos de cimento, menos chapas de zinco e menos pregos, que os mencionados nos vossos relatórios!!!
* Empreendimento turístico, situado no concelho de Montemor-o-Novo, e que é propriedade do Paulo Raposo, ex-alferes da C. Caç. 2405.
sexta-feira, 2 de novembro de 2007
P40: CARLOS MONIZ

Tendo tomado conhecimento que o Millennium-bcp estava a conceder, facilmente, créditos em valores a rondar os 12.500.000 Euros, tinha já dito à minha Maria que, atendendo ao facto de ter um ex-colega de armas que trabalhava no dito cujo Banco, hoje sexta-feira, 2 de Novembro, para não contar comigo para almoço pois iria a Alcântara tentar a minha sorte. Mas, raio de azar, entretanto recebo um mail do Moniz comunicando, precisamente, que partir de hoje deixaria de pertencer ao quadro de efectivos do Banco, passando a gozar merecido descanso na qualidade de aposentado.
AGORA A SÉRIO
Em nome pessoal deste gestor do nosso Blog e, tomo a liberdade de escrever na qualidade, também, de representante do sentir colectivo da nossa Companhia (embora não mandatado para tal) desejamos que gozes uma reforma dourada desfrutando da pacatez que só o nosso Alentejo consegue propiciar.
Quero, também, nesta hora, agradecer-te, enquanto Furriel do nosso Pelotão, toda a LEALDADE, COLABORAÇÃO e SENTIDO DE MISSÃO com que nos presenteaste ao longo daqueles, praticamente, 2 anos passados em condições que todos nós conhecemos.
quarta-feira, 31 de outubro de 2007
P39: CORREIA FOSTE ALDRABADO - A verdade 37 anos depois!!!
Com a devida autorização do autor (Alferes Rui Felício da C. Caç. 2405, Companhia que nós fomos render) passo a transcrever uma estória que nos diz respeito. Sim, nós somos os "atónitos periquitos". Espera lá, Rui, que no próximo encontro da Tertúlia do Luís Graça eu dou-te os "atónitos". Ah, e, também, estará presente o Tenente-Coronel Carlos Correia, precisamente o alferes a quem tu puseste (o mago Luís de Matos não faria melhor) a ver sacos de cimento a quadruplicar.
TRANSFERÊNCIA DE CARGA (ou a arte do desenrascanço que a tropa afinal nos ensinou)...
Daí a poucos dias íamos finalmente embarcar em Bissau no Carvalho Araújo para o ansiado regresso…
Tinhamos acabado de receber no Dulombi a Companhia de atónitos periquitos que, durante uma semana, iam ficar em sobreposição connosco.
Acolhemo-los com o aquele ar superior de guerreiros invencíveis, calejados pelos combates, a pele tisnada dos sóis tropicais, e além das costumadas praxes, meio inofensivas, que exercemos sobre eles, dedicámos-lhes, com a proverbial simpatia característica dos Baixinhos do Dulombi, um hino de recepção ao periquito que ainda hoje cantamos em todos os almoços anuais de comemoração que realizamos.
Fui eu o autor da letra (perdoem-me o orgulho ) que, em versos decassilábicos, procurava transmitir aos novatos o que era o dia a dia que os esperava nos confins do mato onde iriam passar dois anos.
O Alf Mil Rijo sacou dos seus dotes musicais até aí ocultos e plagiou uma música que se adaptasse à versalhada que em momento de suprema inspiração eu tinha produzido. É ele que hoje guarda religiosamente essa letra que eu, embora seu autor, não sou já capaz de reproduzir na íntegra (3).
...Mas urgia transferir o espólio da Companhia aos novos... Formou-se então uma equipa para conferir e entregar aos novos as cargas que oficialmente estavam a cargo da Companhia. E por parte dos periquitos procedeu-se de igual modo para as receber, assinando os respectivos recibos de quitação.
A mim e ao furriel Veiga coube-nos a tarefa, entre algumas outras mais simples, de entregar aos periquitos os materiais de construção que a nossa Companhia tinha (ou devia ter…) em armazém e que recebera com a exclusiva finalidade de serem usados na edificação de casas para a população que foi deslocada no âmbito do programa de reordenamentos.
No essencial, os materiais de construção a que me refiro eram constituídos por sacos de cimento, chapas de zinco, barrotes de madeira, pregos, ferramentas diversas, etc.
O problema é que os mapas de existências e de movimentação de stocks exibiam quantidades muito superiores (!!!) às que efectivamente existiam…
E eram mapas assinados pelo Capitão, pelo Sargento Silvano e por mim próprio, regularmente enviados superiormente para os Serviços de Adminsitração Militar em Bissau e, quiçá, em Lisboa.
Estava portanto fora de questão a sua falsificação!
A verdade é que, se os não entregássemos à nova Companhia e esta, como seria natural, se recusasse a ignorar as diferenças, isso redundaria por certo num demorado e complicado processo de inquérito para apuramento de responsbilidades, seguido de um outro de cariz disciplinar para punição dos responsáveis.
Resumindo: Uma grandessissima chatice a meia dúzia de dias do embarque!
Sei que vos baila no pensamento a natural pergunta:
- E como foram gastas tão significativas quantidades de materiais de construção, se não foram aplicadas na totalidade nos tais reordenamentos?
Os meu queridos amigos Vitor David e Paulo Raposo, ambos alferes dos Baixinhos do Dulombi, se estiverem a ler isto, são dos poucos que não fazem essa pergunta. O primeiro porque sabe o destino dos tais materiais em falta. O segundo porque foi ele mesmo quem lhes deu o (in)devido destino…
Fez ele bem, comento eu!
O Raposo, como já tive ocasião de dizer noutros escritos semelhantes a este, era uma pessoa desenrascada, que não abdicava do mínimo de conforto que as circunstâncias lhe permitissem.
Combater sim, mas confortavelmente, se possível…
Quando começámos a receber o cimento e as chapas de zinco em apreciáveis quantidades, destinadas ao reordenamento da população e também à construção de um heliporto, o Raposo, indiferente aos reparos do Capitão Jerónimo, mobilizou os seus soldados para cimentarem o seu abrigo e para revestirem o respectivo tecto, por baixo da terra que o cobria, com chapas de zinco na tentativa de o impermeabilizar às águas da chuvas que nos restantes abrigos inundavam por completo o interior.
Não seria, porém, na altura da transferência das cargas que iriamos falar disso. Era assunto tabu!
Importante era descortinar uma forma de entregar sem falhas os materiais que constavam dos papéis. Embora sabendo-se que já só existiam em pequena parte…
A noite é boa conselheira e em África acho que ainda mais. E por isso, quando acordei no dia seguinte já tinha mentalmente encontrado a solução.
Contando obviamente com a inexperiência do alferes periquito ( seja me desculpado tratá-lo assim, mas o seu nome já se me varreu…), que me iria assinar os recibos de quitação da entrega, libertando-me de responsabilidades.
Chamei o Veiga, furriel de transmissões e matosinhense muito vivo e desenrascado, e segredei-lhe:
- Oh Veiga, eu vou chamar o alferes periquito e começarei por lhe dizer que os materias de construção que lhe vamos entregar estão dispersos por variados lugares da tabanca.
E continuei:
- Depois digo-lhe que temos que ir anotando num caderno as quantidades que contarmos em cada um desses locais, somando tudo no final e conferindo com os mapas oficiais da Companhia.
Prossegui, perante o olhar atento do Veiga, que ia abanando a cabeça em sinal de assentimento:
- Para que as coisas resultem como eu quero, é necessário iniciarmos este trabalho à hora de maior calor, digamos que por volta da uma da tarde, a seguir ao almoço.
De sobrolho franzido, o Veiga interrompeu-me:
- Porquê? Não entendo o motivo…
Retorqui-lhe, sorrindo:
- Mais adiante você vai compreender!
E continuei, descrevendo o plano:
- Agora você pega em meia dúzia de soldados e manda carregar em cima de um Unimog os poucos sacos de cimento e chapas de zinco que temos fechadas na tabanca que serve de armazém improvisado.
Sem perder o folego, acrescentei:
- De seguida manda-os descarregar num sítio qualquer, de preferência meio escondidos entre as tabancas, por forma a não serem visíveis de longe, e depois vem me chamar à messe onde estarei com ele, para nos deslocarmos ao sítio onde você despejou os materiais.
E porsseguindo:
- Depois de anotarmos no tal caderno as quantidades que tivermos contado, e perante o insuportável calor que estaremos sentindo, eu convido-o a si e ao alferes a virem beber uma cerveja. Você inventará um desculpa e recusará o convite. Logo que eu e ele nos afastarmos, você volta a carregar os materiais e colocá-los-á noutro sítio da tabanca afastado daquele, enquanto o alferes periquito se encharca em cerveja para vencer o tórrido calor da uma da tarde…
O Veiga sorriu e interrompeu-me de novo:
- Agora entendo porque é que o meu alferes disse que mais adiante eu ia perceber a razão da hora do calor para se fazer este trabalho! O homem a cada caminhada que fizer não vai querer outra coisa senão abrigar-se do calor e matar a sede…
- Para mais, periquito transpira como o caraças!...
- ... Enquanto me dá tempo para eu mudar os materiais de um sitio para outro - concluiu o furriel com uma sonora gargalhada.
Epílogo
O alferes periquito sucumbiu ao truque. E encharcou-se com alguns litros de cerveja que eu magnanimamente lhe fui oferecendo ao longo daquela tarde.
Acho que nas últimas duas contagens ele já via tudo a dobrar, o que, se assim foi, acabou por me beneficiar nos cálculos finais…
Lamento dizê-lo mas há uma regra básica que o próprio exército nos ensinou: A tropa manda desenrascar…
Tenho a certeza que ele acabou por fazer algo parecido quando acabou a comissão.. e isso alivia-me os remorsos…
Sim, porque tenho muitas dúvidas que as existências das Companhias do mato alguma vez conferissem com os papéis que constavam das secretarias.
O resultado das contagens acabou por dar no seguinte:
(i) Os mesmos sacos de cimento foram contados 4 vezes;
(ii) As mesmas chapas de zinco, 5 vezes
(iii) Os mesmos pregos, 2 vezes
Tudo somado deu um total praticamente igual ao que constava nos papéis oficiais do Sargento Silvano.
E tudo acabou em bem!
Se isto fosse um romance côr de rosa e se em vez do alferes periquito eu estivesse a transferir as cargas para a enfermeira paraquedista Rosa, podia terminá-lo à laia dos filmes da década de 50:
... e casaram, foram muito felizes e procriaram belos e rechonchudos rebentos…
The End
Rui Felício
Ex-Alf Mil Inf
CCAÇ 2405 (1968/70)
TRANSFERÊNCIA DE CARGA (ou a arte do desenrascanço que a tropa afinal nos ensinou)...
Daí a poucos dias íamos finalmente embarcar em Bissau no Carvalho Araújo para o ansiado regresso…
Tinhamos acabado de receber no Dulombi a Companhia de atónitos periquitos que, durante uma semana, iam ficar em sobreposição connosco.
Acolhemo-los com o aquele ar superior de guerreiros invencíveis, calejados pelos combates, a pele tisnada dos sóis tropicais, e além das costumadas praxes, meio inofensivas, que exercemos sobre eles, dedicámos-lhes, com a proverbial simpatia característica dos Baixinhos do Dulombi, um hino de recepção ao periquito que ainda hoje cantamos em todos os almoços anuais de comemoração que realizamos.
Fui eu o autor da letra (perdoem-me o orgulho ) que, em versos decassilábicos, procurava transmitir aos novatos o que era o dia a dia que os esperava nos confins do mato onde iriam passar dois anos.
O Alf Mil Rijo sacou dos seus dotes musicais até aí ocultos e plagiou uma música que se adaptasse à versalhada que em momento de suprema inspiração eu tinha produzido. É ele que hoje guarda religiosamente essa letra que eu, embora seu autor, não sou já capaz de reproduzir na íntegra (3).
...Mas urgia transferir o espólio da Companhia aos novos... Formou-se então uma equipa para conferir e entregar aos novos as cargas que oficialmente estavam a cargo da Companhia. E por parte dos periquitos procedeu-se de igual modo para as receber, assinando os respectivos recibos de quitação.
A mim e ao furriel Veiga coube-nos a tarefa, entre algumas outras mais simples, de entregar aos periquitos os materiais de construção que a nossa Companhia tinha (ou devia ter…) em armazém e que recebera com a exclusiva finalidade de serem usados na edificação de casas para a população que foi deslocada no âmbito do programa de reordenamentos.
No essencial, os materiais de construção a que me refiro eram constituídos por sacos de cimento, chapas de zinco, barrotes de madeira, pregos, ferramentas diversas, etc.
O problema é que os mapas de existências e de movimentação de stocks exibiam quantidades muito superiores (!!!) às que efectivamente existiam…
E eram mapas assinados pelo Capitão, pelo Sargento Silvano e por mim próprio, regularmente enviados superiormente para os Serviços de Adminsitração Militar em Bissau e, quiçá, em Lisboa.
Estava portanto fora de questão a sua falsificação!
A verdade é que, se os não entregássemos à nova Companhia e esta, como seria natural, se recusasse a ignorar as diferenças, isso redundaria por certo num demorado e complicado processo de inquérito para apuramento de responsbilidades, seguido de um outro de cariz disciplinar para punição dos responsáveis.
Resumindo: Uma grandessissima chatice a meia dúzia de dias do embarque!
Sei que vos baila no pensamento a natural pergunta:
- E como foram gastas tão significativas quantidades de materiais de construção, se não foram aplicadas na totalidade nos tais reordenamentos?
Os meu queridos amigos Vitor David e Paulo Raposo, ambos alferes dos Baixinhos do Dulombi, se estiverem a ler isto, são dos poucos que não fazem essa pergunta. O primeiro porque sabe o destino dos tais materiais em falta. O segundo porque foi ele mesmo quem lhes deu o (in)devido destino…
Fez ele bem, comento eu!
O Raposo, como já tive ocasião de dizer noutros escritos semelhantes a este, era uma pessoa desenrascada, que não abdicava do mínimo de conforto que as circunstâncias lhe permitissem.
Combater sim, mas confortavelmente, se possível…
Quando começámos a receber o cimento e as chapas de zinco em apreciáveis quantidades, destinadas ao reordenamento da população e também à construção de um heliporto, o Raposo, indiferente aos reparos do Capitão Jerónimo, mobilizou os seus soldados para cimentarem o seu abrigo e para revestirem o respectivo tecto, por baixo da terra que o cobria, com chapas de zinco na tentativa de o impermeabilizar às águas da chuvas que nos restantes abrigos inundavam por completo o interior.
Não seria, porém, na altura da transferência das cargas que iriamos falar disso. Era assunto tabu!
Importante era descortinar uma forma de entregar sem falhas os materiais que constavam dos papéis. Embora sabendo-se que já só existiam em pequena parte…
A noite é boa conselheira e em África acho que ainda mais. E por isso, quando acordei no dia seguinte já tinha mentalmente encontrado a solução.
Contando obviamente com a inexperiência do alferes periquito ( seja me desculpado tratá-lo assim, mas o seu nome já se me varreu…), que me iria assinar os recibos de quitação da entrega, libertando-me de responsabilidades.
Chamei o Veiga, furriel de transmissões e matosinhense muito vivo e desenrascado, e segredei-lhe:
- Oh Veiga, eu vou chamar o alferes periquito e começarei por lhe dizer que os materias de construção que lhe vamos entregar estão dispersos por variados lugares da tabanca.
E continuei:
- Depois digo-lhe que temos que ir anotando num caderno as quantidades que contarmos em cada um desses locais, somando tudo no final e conferindo com os mapas oficiais da Companhia.
Prossegui, perante o olhar atento do Veiga, que ia abanando a cabeça em sinal de assentimento:
- Para que as coisas resultem como eu quero, é necessário iniciarmos este trabalho à hora de maior calor, digamos que por volta da uma da tarde, a seguir ao almoço.
De sobrolho franzido, o Veiga interrompeu-me:
- Porquê? Não entendo o motivo…
Retorqui-lhe, sorrindo:
- Mais adiante você vai compreender!
E continuei, descrevendo o plano:
- Agora você pega em meia dúzia de soldados e manda carregar em cima de um Unimog os poucos sacos de cimento e chapas de zinco que temos fechadas na tabanca que serve de armazém improvisado.
Sem perder o folego, acrescentei:
- De seguida manda-os descarregar num sítio qualquer, de preferência meio escondidos entre as tabancas, por forma a não serem visíveis de longe, e depois vem me chamar à messe onde estarei com ele, para nos deslocarmos ao sítio onde você despejou os materiais.
E porsseguindo:
- Depois de anotarmos no tal caderno as quantidades que tivermos contado, e perante o insuportável calor que estaremos sentindo, eu convido-o a si e ao alferes a virem beber uma cerveja. Você inventará um desculpa e recusará o convite. Logo que eu e ele nos afastarmos, você volta a carregar os materiais e colocá-los-á noutro sítio da tabanca afastado daquele, enquanto o alferes periquito se encharca em cerveja para vencer o tórrido calor da uma da tarde…
O Veiga sorriu e interrompeu-me de novo:
- Agora entendo porque é que o meu alferes disse que mais adiante eu ia perceber a razão da hora do calor para se fazer este trabalho! O homem a cada caminhada que fizer não vai querer outra coisa senão abrigar-se do calor e matar a sede…
- Para mais, periquito transpira como o caraças!...
- ... Enquanto me dá tempo para eu mudar os materiais de um sitio para outro - concluiu o furriel com uma sonora gargalhada.
Epílogo
O alferes periquito sucumbiu ao truque. E encharcou-se com alguns litros de cerveja que eu magnanimamente lhe fui oferecendo ao longo daquela tarde.
Acho que nas últimas duas contagens ele já via tudo a dobrar, o que, se assim foi, acabou por me beneficiar nos cálculos finais…
Lamento dizê-lo mas há uma regra básica que o próprio exército nos ensinou: A tropa manda desenrascar…
Tenho a certeza que ele acabou por fazer algo parecido quando acabou a comissão.. e isso alivia-me os remorsos…
Sim, porque tenho muitas dúvidas que as existências das Companhias do mato alguma vez conferissem com os papéis que constavam das secretarias.
O resultado das contagens acabou por dar no seguinte:
(i) Os mesmos sacos de cimento foram contados 4 vezes;
(ii) As mesmas chapas de zinco, 5 vezes
(iii) Os mesmos pregos, 2 vezes
Tudo somado deu um total praticamente igual ao que constava nos papéis oficiais do Sargento Silvano.
E tudo acabou em bem!
Se isto fosse um romance côr de rosa e se em vez do alferes periquito eu estivesse a transferir as cargas para a enfermeira paraquedista Rosa, podia terminá-lo à laia dos filmes da década de 50:
... e casaram, foram muito felizes e procriaram belos e rechonchudos rebentos…
The End
Rui Felício
Ex-Alf Mil Inf
CCAÇ 2405 (1968/70)
sexta-feira, 26 de outubro de 2007
P38: A GUERRA - JOAQUIM FURTADO
Para quem não teve oportunidade de ver, ou queira rever, os dois primeiros episódios do documentário "A Guerra", de autoria de Joaquim Furtado, transmitido às terças-feiras na RTP1, divulgamos os respectivos links:
http://video.google.com/videoplay?docid=3447043195587297606
http://video.google.com/videoplay?docid=-381425284473860096
Com agradecimentos a Abreu dos Santos, nosso companheiro na Tertúlia do Luís Graça (http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/)
http://video.google.com/videoplay?docid=3447043195587297606
http://video.google.com/videoplay?docid=-381425284473860096
Com agradecimentos a Abreu dos Santos, nosso companheiro na Tertúlia do Luís Graça (http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/)
terça-feira, 9 de outubro de 2007
P37: CAMARADA
35 anos após o nosso regresso da Guiné concordas com a definição, que nos dá Lobo Antunes, de camarada:
"Camarada não é bem irmão, amigo, companheiro, cúmplice... é uma
mistura disto tudo com raiva, esperança, desespero, medo, alegria,
revolta, coragem, indignação e espanto, é uma mistura disto tudo com
lágrimas escondidas" (António Lobo Antunes, 2007)
"Camarada não é bem irmão, amigo, companheiro, cúmplice... é uma
mistura disto tudo com raiva, esperança, desespero, medo, alegria,
revolta, coragem, indignação e espanto, é uma mistura disto tudo com
lágrimas escondidas" (António Lobo Antunes, 2007)
terça-feira, 25 de setembro de 2007
P36: C. CAÇ. 2701

Neste Domingo deslocando-me de Sul em direcção à Lusa-Atenas e sabendo que estava a decorrer o Encontro da 2.701, em plena A8 foi só fazer um ligeiro desvio rumo a Alfeizerão para ter o prazer de dar um abraço ao Coronel Carlos Clemente, ao Mota, ao Rocha (já não estava com ele há 27 anos), ao Paulinho Santiago, ao Belarmino, ao Santos, ao Duarte, ao Sargaço e embora não pertencesse a esta Companhia, foi uma agradável surpresa ter encontrado o Constantino, amigo de longa data que também já não via há bastante tempo.
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