José Guerra |
1971 |
No Post n.º 389 – José da Silva Guerra, com texto de António Tavares, ex-furriel do nosso Batalhão, no final pode ler-se: "O Guerra apareceu num dos nossos convívios. Eu nunca mais o vi desde Março/1972. Consta que já faleceu".
Ora, nas
minhas últimas pesquisas, também procurei saber da veracidade do falecimento ou
não do GUERRA.
Felizmente,
está vivo e de boa saúde.
Com sua autorização passo a transcrever a carta que o José Guerra me enviou:
“Amigo Lemos aí vai depois da injustiça que aqueles três malandros
fizeram comigo, pois chegou um oficial que eu tinha de cá ficar mais uns dias;
e eu disse-lhe com um sorriso amarelo que não havia problema, já que não morri
naqueles meses todos, também, se Deus quiser não me vai acontecer nada.
Bem, o último mês foi complicado. Primeiro começaram a chegar mensagens
de toda e toda a espécie. Eu tinha que estar no Posto de Rádio a toda a hora, os outros radiotelegrafistas não tinham. Depois vim a saber que os Altos Comandos estavam a
informar o Comando do Batalhão que o inimigo se estava a infiltrar cada vez
mais no nosso sector. Foi aí que as coisas começaram a aquecer. Eu fiquei muito
triste quando os nossos amigos morreram, mas isto foi desolador. Eu nunca vi
tanta tristeza. Mal os carros do Saltinho começaram a descarregar os caixões,
comecei a ajudar…Foi tão triste ver aqueles rapazes ainda não tinham chegado há
um mês e já iam mortos para casa.
Uns choravam, outros corriam-lhe as lágrimas pelas faces abaixo. Foi
muito triste. Nunca pensei assistir a uma cena daquelas depois de dois anos de
guerra. Meu amigo, não desejo a ninguém uma cena destas. É muito doloroso.
Ainda hoje não consigo esquecê-la…uns vinte caixões e alguns traziam dois
colegas!!!
Isto passou. Daí a oito dias foi lá o General Spínola. Eu já tinha
conversado com ele no princípio da Comissão, só que desta vez era soldado e na
outra era cabo. Ele perguntou-me: «Então nosso Pronto, então como é que vai
isso?». E eu respondi:
«Bem, meu General só que já estou aqui há dois anos!»
Ele olhou muito sério para mim, bateu-me no ombro de vagar, e sorriu. E
todos saíram do Posto de Rádio.
E eu, oito dias depois fui ter com o Major – 2.º Comandante do Batalhão
– e pus-lhe o meu problema. Ele olhou para mim, ficou muito admirado, e disse:
«Ó homem, vá tratar das suas coisas e vá-se embora rápido, não o quero ver
mais…».
Tratei de tudo e de manhã fui com a coluna para Bafatá, onde apanhei o
Dakota para Bissau.
E acaba aqui a história do último mês de guerra na Guiné.
A gente quando nos encontrarmos pessoalmente, ouvirás o resto da
História que dava para escrever um livro…
Nunca pensei que houvesse homens tão maus e vingativos que se valiam
dos galões para lixar os outros. Esse senhor que me lixou não conseguia
lixar-me de outra maneira, valeu-se dos galões para o fazer.
PS. Amigo, este ano não posso ir ao Convívio porque tenho compromissos
assumidos, mas para a próxima já estarei prevenido, e já vou.
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